domingo, outubro 23, 2005

Exame de Matemática, questão 11 e critérios de classificação

No post anterior critiquei os critérios de classificação. Apresento agora o caso mais gritante da 1ª chamada... depois, decidam vocês.

Questão 11 (os negritos são da minha autoria):
Arrumaram-se três esferas iguais dentro de uma caixa cilíndrica (figura 1).
Como se pode observar no esquema (figura 2):
• a altura da caixa é igual ao triplo do diâmetro de uma esfera;
• o raio da base do cilindro é igual ao raio de uma esfera.
(aqui aparecem as duas figuras, que não incluo porque não sei pô-las aqui)
Mostra que:
O volume da caixa que não é ocupado pelas esferas é igual a metade do volume das três esferas.
(Nota: designa por r o raio de uma esfera.)

Um aluno que:
a) indicasse as fórmulas usadas nos cálculos (com r a designar o raio de uma esfera)
b) pegasse numa régua e medisse as figuras do enunciado;
c) fizesse os cálculos todos com aquelas medidas, mostrando clara e logicamente aquilo que era pedido,

teria que cotação?

Zero!!!
Sim, ZERO!!!

Podem verificar, aqui.

Conclusão: os alunos não sabem matemática?

Ou, no exame, fez-se o que se pôde para que os alunos não tivessem bons resultados?

11 Comments:

Blogger IC said...

Rui, a questão 11 e os severos critérios de classificação dela foi o que suscitou maiores críticas aos correctores. Quem a propôs (e aos respectivos critérios) queria mesmo que os alunos fizessem uma verdadeira demonstração, o que ultrapassa as exigências do programa do 9º ano e exigia uma capacidade de abstracção e de formalização a que só uma reduzida "elite" de alunos corresponderia. Aliás, também a APM focou logo isso na altura, esperemos que não repitam exigências dessas, até porque o item era um dos três que tinham maior cotação. Corrigi mais do que uma prova em que o aluno atribuiu um valor possível ao raio da esfera, fez tudo certinho sob essa hipótese e... cotação ZERO!! (como já disseste)

24/10/05 02:39  
Anonymous Anónimo said...

Diferença abismal entre este ultimo comentário e o post. Obviamente uma questão de honestidade intelectual que o comentário tem e o post não tem.
Num exame com critérios de correcção extremamente facilitistas (aquela do rodas no sentido contrário aos ponteiros do relógio e levas a cotação toda, rodas ao contrário e levas metade, não lembrava ao diabo), pegar na única questão difícil do teste e na exigência (exagerada)dos respectivos critérios de correcção, e generalizar para o todo, demonstra bem a que ponto chegou uma parte da classe docente.
Caro colega, deixe-se de desculpas esfarrapadas e tenha a honestidade de reconhecer que andamos (nem todos) a brincar e a fazer experimentação pedagógica com os filhos dos outros.
Uma disciplina como a matemática não é compatível com pedagogias que têm aversão ao trabalho, ao esforço, à força de vontade e ao mérito. Esta tem sido a vossa escola e os resultados estão à vista de todos. O país continua a permitir que de uma forma verdadeiramente criminosa o seu único recurso ( a massa cinzenta) seja destruído geração após geração nas nossas escolas.
Com a desculpa (de mau pagador) da massificação, tornamos a escola elitista como nunca o tinha sido anteriormente. Só os geneticamente dotados e os que têm posses (pagando explicações) saem com conhecimentos sólidos. Aos outros, a maioria, preocupamo-nos em fornecer apenas um espaço de felicidade e alegria, em suma , a idiotização completa de gerações.
Se, como diz, teve oportunidade de ver alguns exames (eu vi mais de uma centena) e não reparou no verdadeiro holocausto intelectual traduzido na maior parte das (não)respostas e nos raciocínios, então digo-lhe que você deve ser um homem feliz.

P.S. Há sempre uma solução para o problema. Um examezito no estilo do de Língua Portuguesa, e os nossos alunos viram matemáticos puros.

24/10/05 17:42  
Blogger Rui Diniz Monteiro said...

Cara Isabel, eu sei tudo o que tu aqui dizes, mas ainda bem que o escreveste para esclarecer os que possam desconhecer estes aspectos.
O meu post refere-se, no entanto, a outra coisa: às perguntas do exame que induziam o aluno a responder de uma determinada maneira, errada, sem com isso se ficar a saber se o aluno sabe muito, se sabe pouco ou nada, não se valorizando, portanto, o seu saber quando ele existe (um outro exemplo disto é a questão 10, parece-me).
Repara, Isabel, quando se pede que o aluno “mostre”, não se está a pedir que demonstre. E quando se fala do volume “da” caixa, principalmente depois de tê-la posto na pergunta para o aluno a “observar”, não, de todo não se está a pedir uma demonstração, senão usava-se o verbo “demonstrar” e não “mostrar”. Não concordas?
É também preciso não esquecer que o exame é dirigido a adolescentes de 15 anos, provavelmente sem muita experiência de serem “rasteirados”, e que é o primeiro exame por que eles passam (na minha escola, estes alunos nunca chegaram sequer a fazer a prova aferida).
Desculpa este comentário longo, mas se calhar o meu post não foi claro nas suas intenções e, portanto, aqui fica o esclarecimento.

24/10/05 20:50  
Blogger Rui Diniz Monteiro said...

Colega, vir dar lições de honestidade intelectual, a coberto do anonimato, a alguém que assina com o seu próprio nome e não esconde a sua identidade, tem que admitir: é caso para algumas gargalhadas, não acha? Passemos, portanto, adiante (recomendo-lhe, no entanto, que leia o meu comentário anterior a fim de perceber melhor onde é que eu queria chegar com o meu post).
Não vou rebater os seus argumentos sérios, pois é evidente para todos que aquilo que você diz não está completamente destituído de algum fundamento.
Quanto aos outros, aqueles que me são dirigidos com algum furor, a resposta vai em forma de história... verídica, claro. Passada com o filho de um colega nosso.
Encontrei o rapaz, um dia, na rua, e ele dirigiu-se-me. Disse-me que tinha tido 20 na prova global de Matemática (do 10º) e queria dar-me os parabéns por isso. Que eu recusei dizendo que ele é que tinha estudado e que, de qualquer modo, eu só tinha sido professor dele até ao 9º (aliás, nunca lhe dei mais de 4). Aí, ele disse-me:
“Não, setor, são mesmo para si os parabéns. O setor lembra-se, nas suas aulas, de estar sempre a obrigar-nos a pensar? Por isso, eu cheguei ao 10º e percebi tudo, toda a matéria.”

24/10/05 21:24  
Anonymous Anónimo said...

Rui, José,António, Carlos, Anónimo, qual é a diferença? Em que é que isto se relaciona com a desonestidade intelectual? Quantos comentadores conhece que escrevem na blogosfera com o seu nome completo?
Desonestidade intelectual é quando apenas contamos uma parte dos factos, aquela que normalmente nos interessa, para induzir determinada ideia que queremos passar.
"Pegar na única questão difícil do teste e na exigência (exagerada)dos respectivos critérios de correcção, e generalizar para o todo, demonstra bem a que ponto chegou uma parte da classe docente".Foi isto que eu disse.Reconheci de forma inequivoca a dificuldade do exercício e o exagero dos critérios de correcção.
"Ou, no exame, fez-se o que se pôde para que os alunos não tivessem bons resultados?" Isto foi o que você insinuou. Esta foi a ideia que quis passar.
Nas reuniões de corretores em que participei não me lembro de ninguém que não tivesse questionado fortemente os critérios de correcção da questão 11. E toda a gente estranhava ainda mais a exigência, porque todos os outros critérios eram puramente anedóticos. No meu comentário dei um exemplo. Mas muitos mais podia dar em relação a outras questões onde ao corretor eram dadas ordens para tentar advinhar o que é que teria passado pala cabeça do aluno.
Quanto à história verídica que conta não sei a que propósito a foi buscar. Não o acusei, nem podia, de incompetente. Não o conheço. Apenas posso formular juizos sobre o que escreve.
Mas já agora deixe-me dizer-lhe que provas globais passadas aos alunos na vespera conheço dezenas e dezenas (para não exagerar), e então a filhos de professores no secundário nem é bom falar. Lembra-se daquela "gripe das aves" em Guimarães em que todos os alunos apareciam doentes? Sabe quem teve a ideia? Sabe quem durante uns anos usufruiu dela até que a pandemia se generalizou?
É por estas e por outras, que acontecem todos os dias, que a ministra sente as costas quentes da opinião publica e pensa pôr os professores a dormir nas escolas.
Só nos podemos queixar de nós próprios, porque fomos coniventes com os que transformaram as salas de aula num prolongamento dos recreios. Com aqueles que sempre tiveram medo dos exames. Com aqueles que sempre impediram qualquer avaliação externa.Com aqueles que sempre se julgaram acima da qualquer avaliação que não fosse a sua própria.
Espero que os exames do nono ano venham para ficar. Espero que os futuros exames do nono ano tenham um grau de dificuldade idêntico ao de este ano, o qual me pareceu equilibrado. Espero e desejo que os futuros exames do nono ano tenham enunciados que não testem as capacidades de interpretação em Lingua Portuguesa de forma mais exigente da do próprio exame da lingua materna, ao contrário do que este ano aconteceu.Finalmente espero que os jovens do meu país tenham um sucesso escolar assente em conhecimentos sólidos e deixem de ocupar os ultimos lugares nos estudos internacionais nas áreas cientificas.
Espero que este país tenha futuro e que as escolas saibam dar aos jovens as ferramentas necessárias para os tempos adversos que estão a chegar.

24/10/05 22:59  
Anonymous Anónimo said...

Ao colega anónimo: sabe, dispenso a sua opinião (mesmo favorável)e as suas comparações sobre a honestidade intelectual e esclareço-o de que ensino os meus alunos a não se precipitarem a opinar, o que também faz parte da educação para o rigor intelectual.

Caro Rui: Escrevinhei, na altura, coisas soltas sobre os resultados dos exames, mas quando, agora depois da análise das provas, fizer o relatório que inclui uma síntese sobre as causas dos resultados que consideramos mais relevantes, não deixarei de pôr um post sobre o assunto, espero que possamos dialogar mais nessa altura, na sequência de outros diálogos que já tivemos aqui na blogosfera. Quanto ao relato que fazes, pois, Rui, são esses encontros com ex-alunos que nos dão os verdadeiros feedbacks, são eles que nos conhecem como professores, são eles também que por vezes nos animam no meio deste ataque todo a que estamos a ser sujeitos. Abraço.

25/10/05 02:46  
Anonymous Anónimo said...

Rui, voltei aqui para te contar uma pequena história humana relacionada com o exame de Matemática. Uma das minhas (ex)alunas era fraquinha a Matemática, tinha dificuldades, no 8º dei-lhe sempre 2. Mas, ela dizia que não valia a pena tentar porque não tinha suficiente capacidade, e a Matemática era a disciplina mais difícil. Preocupei-me em tirar-lhe essa ideia da cabeça. No penúltimo teste do 9º (sobre curta matéria) teve positiva e a seguir, no teste global (estavam dispensados da prova global, mas não os dispensei de teste equivalente) foi feliz, conseguiu também positiva, embora baixinha. Não hexitei em atribuir-lhe o 3 - não ia precisar mais de estudar Matemática, mas ia precisar de ter melhor auto-imagem quanto a capacidades. Tinha como certo que não se aguentaria no exame (era previsível que este incidisse sobre certas competências mais gerais que ela ainda não tinha). A prova dela é uma das que me calharam para analisar e hoje vi um zero no item das probabilidades. Ela sabia calcular, usou correctamente o nº de casos favoráveis, mas despistou-se a "contar" o total de cubos - 10 em vez de 12. Pelos critérios (isto também foi contestado pelos correctores) se o erro fosse ao contrário - nº de casos possíveis certo e erro no de casos favoráveis, teria 4 pontos. Moral da história (que não tem qualquer relevância para a análise dos resultados, mas teve decerto para esta menina - e cada aluno é uma pessoa, por isso importante). Com esses 4 pontos teria negativa na mesma, mas, face ao descalabro nacional, isso não a inferiorizaria outra vez. Mas, com esses 4 pontos já não figuraria na pauta da sua turma com o "terrivel" 1 - um 1 ali isolado, único. (Ainda não analisei o resto da prova dela, até pode haver mais pontos que podia ter)
(Preferia que este comentário não fosse para ser comentado por outros comentadores, é só um relato para ti, que julgo seres o único colega de Mat do 3º Ciclo que conheço por aqui, e que há tempo escrevias: "A principal qualidade de um bom professor é o Amor pelos seus alunos" :)
(Desculpa o espaço que ocupei e agora vou dormir, que estive a certificar-me no site do GAVE sobre os critérios do item, já não tenho os critérios comigo)

25/10/05 04:33  
Anonymous Anónimo said...

Seja lá o que fôr que (acha que) sabe dos colegas da sua (ou deveria dizer da nossa???) escola, deveria saber que "onde lhe cabe a comida, também devia caber-lhe o resto"! E se pretende denunciar alguém, pelo menos faça-o "com tomates"!!!
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Guimarães,Bragança, um certo colégio ali em entre campos (resultados mirabolantes no secundário recorrente, muito procurado por filhos de professores) tudo público, denunciado e não desmentido.
Felizmente que uma larga maioria (silenciosa) não se revê no meter a cabeça na areia e no negar das evidências.
Só encontro uma desculpa (comum a muitos professores) para a assanhada defesa da incompetência. Ficaram com os pedagogos da primeira metade do século vinte, e esqueceram-se que a terra continuou a girar.
Como são seres superiores (imunes a qualquer critica e com uma auto estima considerável, tipica de quem sempre se auto-avaliou e recusa as avaliação externas)dou-vos um humilde conselho (posso porque é de borla) saiam um pouco dos vossos locais de trabalho, falem com pessoas diferentes, outras realidades, que os vossos alunos e os pais agradecem.
Fiquem com a vossa (até poderem) e saúde.

26/10/05 00:47  
Blogger matilde said...

Apenas comento o post inicial, e não comentários anteriores...

Ainda tenho o estômago às voltas com os crítérios de correcção do exame, em particular desta questão 11...

Na verdade considero que este exame e os seus resultados deram um "excelente contributo" para que alunos e pais ainda mais se conveçam que não vale a pena estudar Matemática...

Como profesora de Matemática, quando pego numa turma, a minha 1ª preocupação é procurar levar os alunos a entender que é possível aprender Matemática!... Quando soube os resultados dos exames de Matemática do 9º ano ía-me dando "uma coisinha má" e pensei para comigo - bem, não sei o que se passa com os alunos portugueses... Quando posteriormente vi os critétios de correcção do exame rectifiquei o meu pensamento - o que se passa afinal com o nosso Ministério da Educação?!... O que querem de nós professores?... que façamos milagres, não?! Com uma bela campanha lançada pela comunicação social de que a Matemática é inatingível...

Bem, hoje estou particularmente irritada porque também sou professora do 3º ciclo e também tenho exames de Matemática para analisar... Não estou irritada pelo trabalho extra que tenho de ter, mas sim pela constatação em situações concretas do que me parecem uns critérios de correcção muito pouco coerentes com as competências específicas da Matemática para o Ensino Básico...

Vamos ver quais vão ser as conclusões disto tudo... para já, e até indicação em contrário, tento ser optimista... até porque só assim consigo analisar os exames...

28/10/05 01:15  
Anonymous Anónimo said...

Tit,...

... damos-te as boas-vindas!

Gratos pela visita e pelo contributo!

Para o "keep in touch" ser mais fácil, "O Canto do Vento" já é também uma das nossas salas de aula favoritas!...

Foi um pouco abusivo da nossa pate, pois nem te pedimos licença, mas... basta uma palavra tua e retiraremos no momento! Até lá, iremos fazer visitas e, quem sabe, ouvir um pouco d'"O Canto do Vento"!...

;o) The LBug

30/10/05 16:43  
Blogger matilde said...

A licença tá dada! Obrigada :)
Vou-vos pôr também ligada ao meu "Canto do Vento"...

Estarei também por perto dos (In)Docentes.

Um abraço, Tit

31/10/05 09:57  

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